Como funciona o filme de Raio X
E como ele é uma possível alternativa ao filme fotográfico que conhecemos

Todo mundo já ouviu falar do empecilho de trazer filme na mala do aeroporto e porque sempre se recomenda que sejam colocados na bagagem de mão e que se peça uma revista manual. O motivo: Raio X.
O Raio X já foi um grande problema no contexto da fotografia analógica; mas será que hoje, durante a crise de importação e preço dos filmes, o Raio X é uma possível alternativa para baratear e acessibilizar a fotografia e o processo de revelação fotográfica?
Voltando ao básico da teoria fotográfica e às aulas de química e física, relembrando conceitos, fica muito fácil de entender.
Fotografia, como a etimologia já sugere, desmembra em 2 radicais: Foto (luz) e Grafia (registro). Radiografia segue o mesmo princípio: Radio (radiação) e Grafia (registro também). Ou seja, ambos os processos se utilizam da mesma coisa.
A “luz” como a conhecemos na Terra são raios. Raios esses que possuem diferentes comprimentos de onda e frequências que a física estuda muito afundo. Mas, para simplificar, vamos tomar a seguinte definição de raio e radiação:
"Radiação é um processo físico de emissão (saída) e de propagação (deslocamento) de energia por meio de partículas ou de ondas eletromagnéticas em movimento. Esse processo pode ocorrer em um meio material ou no espaço (vácuo). São exemplos de radiações bastante conhecidas e comentadas: alfa, beta, gama, raio X, ultravioleta, luz visível, ondas de rádio, infravermelha, microondas, etc."
https://brasilescola.uol.com.br/o-que-e/quimica/o-que-e-radiacao.htm
Visto isso, enquanto seres humanos que são parte do universo e se sujeitam aos efeitos dessa existência, a gente tá constantemente exposto à radiação. Seja ela iônica (que mexe com a organização dos átomos) ou não iônica. De tomar sol a esquentar comida, os raios tão aí. Por isso, seja essa radiação “visível” ou “invisível”, ela vai interagir com coisas nomeadas fotossensíveis.
Mas e aí, como isso se relaciona com fotografia e Raio X?
A fotografia é o processo de registrar imagens através de um anteparo fotossensível. No caso do filme fotográfico preto e branco que conhecemos mais comumente, isso é feito através da estrutura:
Camada plástica (geralmente PET)
Gelatina
Haletos de prata (geralmente AgBr, brometo de prata)
Os haletos (ou sais) de prata possuem uma condição que permite a formação da imagem fotográfica porque escurecem em contato com esses raios, e quando não, não escurecem, fazendo um “jogo de luz e sombra”.
E, coincidentemente, no filme de Raio X, encontramos EXATAMENTE a MESMA estrutura, do químico da prata até a maneira de organizar as camadas.

Esquema representatvo das camadas dos filmes de raio X e fotografia
Então, sim, o filme de raio x é um filme fotográfico, mas ao invés de ter a radiação da luz que conhecemos, se usa nos exames a radiação X, que permeia através de camadas menos densas de átomos (como a pele) e acaba deixando registradas as camadas mais densas (como os ossos).
Qual a diferença de fato do filme de raio X pro filme de fotografia? Fundamentalmente e quimicamente, NENHUMA.
O que muda são as circunstâncias às quais submetemos esses filmes. O raio X opera diferente do raio UV (luz solar), e o método de realizar um raio x envolve usar a densidade atômica como “barreira” para gerar a imagem de luz e sombra.
A luz que usamos na fotografia forma essa imagem de luz e sombra por meio da matéria “maciça” (um prédio ou um corpo fazendo sombra no chão). A câmera fotográfica é uma forma de controlar a luz que age no filme, por isso, estamos sujeitando o filme ao método da câmera, não da sala escura. Não vai fazer diferença no final.
Isso significa que é super fácil e de boa usar o filme de raio x como substituto do filme fotográfico P&B?
Sim e não. Existem alguns problemas que deixam esse trabalho mais complexo de fazer e de gambiarrar.
A primeira coisa é que o filme de raio X é mais comumente encontrado em chapas, por isso, ele vem cortado em um tamanho não correspondente a nenhuma câmera que existe. É tipo por um papel A4 numa lata de atum. Existem, claro, e é mais fácil e óbvio de usar, filmes radiográficos que vêm em latas. A chapa seria correspondente ao Papel Fotográfico, e o filme, ao filme fotográfico.
Ainda assim, todos os filmes de raio X no mercado hoje não poderão só ser colocados em um rebobinador e revendidos, têm que ser cortados. E tem que ser na completa e total escuridão.
O médio formato (ou filme 120) é o menos chato de montar. Mas o custo de uma câmera de médio formato (ou até a facilidade de levar por aí pra maioria de nós) acaba mais como desvantagem para o público geral.
O formato mais acessível e usado hoje é o 135 (ou 35mm), mas cortar o filme de raio X (geralmente com 70mm de largura) exatamente na metade é desafiador, pensando que tem que ser MUITO preciso, e será feito em aproximadamente 1m30cm de filme, se quisermos vender em bobinas e comercializar com 30 e tantas poses.
Tem outro problema com o filme adaptado para 35mm que é perceptível a qualquer pessoa que pegue nele: o filme de raio X é grosso. A espessura da película é geralmente 0,25mm, enquanto a de filmes fotográficos do mercado é por volta de 0,2mm. Essa micro medida é crucial ao passo que muitas câmeras eletrônicas como saboneteiras não são boas em puxar esse filme, que é pesado demais para elas, podendo comprometer a longevidade do mecanismo, travas no meio do uso, ou ela só se recusar a puxar logo na primeira pose se você não prender com uma fita isolante.
O 35mm também tem outro pulo do gato muito complexo que é a FURAÇÃO. A estética que todo mundo ama dos “trilhos” do filme não é só por estética, ela funciona com o propósito de padronizar a estrutura das câmeras para facilitar o “puxar” de uma pose para a outra. A reprodução tem que ser quase que exata, e nenhuma indústria até hoje (que tenha o $caixa$) para fazer isso, se interessou.
Existe outro problema na indústria radiográfica que é: está começando o movimento de parar de usar o filme de raio X em nome de “tecnologias mais modernas”, o que pode ser visto como entrar em um mercado que já tá indo pro saco.
Mas, eu rebato esse meu próprio argumento com o fato maravilhoso de que é possível e amplamente difundido na indústria de radiografia reciclar esses filmes - e não tô falando do plástico PET. Existem tecnologias capazes de tirar 99,9% da prata desses filmes usados para fazer OUTROS filmes. Reciclagem MESMO. E isso é muito interessante do ponto de vista poluente na fotografia analógica.
Em conclusão, eu vejo um potencial muito grande de adaptação no filme de raio x e muitas coisas e ideias novas levam tempo para se desenvolver, ainda mais numa área como a fotografia analógica, onde nossos instrumentos de trabalho foram criados há 50 anos atrás e pensavam nas dinâmicas daquela época. Acredito que tudo é possível e desejo que com o tempo essa ideia se popularize mais e mais.
Te convido a entrar na saga de teste do Filme de Raio X comigo
Fiz um Reels fotografando Bones Films em ISO 6 e ISO 3200 para brincar com a amplitude de velocidade de ISO que ele permite.
Assiste aqui
Tem uma review escrita desse filme da Bones Films bem elaborada na minha Newsletter gratuita do Substack
Leia aqui
E no meu Substack para assinantes da semana, o assunto é Como é possível usar fermentados para revelar filme
Me digam se já testaram ou têm interesse!
Fontes
https://radiopaedia.org/articles/x-ray-film
https://star.med.br/raio-x-o-que-e/
https://brasilescola.uol.com.br/o-que-e/quimica/o-que-e-radiacao.htm
https://www.infoescola.com/fisica/radiacao-ultravioleta/